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26 janeiro 2007
Um escrito antigo, sumido e achado
A leveza era fruto do não-futuro. Da certeza que o combinado tinha prazo de validade.
Então, durante aqueles dias eles foram namorados. Namorados apaixonados, com tudo o que tinham direito: telefonemas bobos, carinhos fora de hora, cenas de ciúme inventadas, fim de tarde no parque, cinema de mãos dadas... Ela gostou de assistir o filme com a cabeça encostada no ombro dele. Pareciam dois bobos, tudo era motivo pra rir. Ele dizia que gostava da risada dela.
Com ele, não era preciso fazer pose, colocar banca, dar uma de recatada. Ela sabia que ele iria embora. Logo, ele iria pegar um avião e toda aquela história não poderia mais ser vivida, só lembrada.
Talvez por isso, ela não tivesse medo de se mostrar, de se permitir, de viver. Talvez por isso, ela não se apegasse aos defeitos que enxergava nele.
Deve ter sido por isso que ela não queria perder tempo. Queria viver tudo o que aquela história poderia ser. Queria ter um estoque de boas lembranças para usar quando a distância não permitisse mais.
Eles tinham o perfeito encaixe. Mãos, braços, pernas, boca... Ela se perdia em meio a tantos carinhos. E desejava. Não entendia o porquê, mas desejava aquele homem. Esquecia do mundo nos braços dele. E não queria mais nada...Entregue, inteira, suada e leve. Sentindo seu corpo misturado ao dele. As pernas enroscadas depois do amor. O silêncio trazia perfeição para o momento. E foi esse momento que ela quis guardar: as pernas enroscadas, o contraste da pele dos dois, molhados de suor. A mão no peito dele, sentindo a respiração acalmar...
Chegou a hora dele ir. Ela sempre foi boba para despedidas. Mas dessa vez não teve drama. Ele vestia uma roupa que não era o estilo que ela gostava (ele ficava parecendo mais velho que era). Ele disse meia dúzia de besteiras que a deixou irritada. Deve ter sido para lembrá-la que o prazo de validade estava se esgotando e que consumir algo fora do tal prazo faz mal pro coração.
Então, ela fez questão de olhar bem pra ele e dizer o quanto tinha sido bom ser a namoradinha por aqueles dias.
Entrou no carro e, diferente das outras vezes, saiu cantando, feliz por ter se permitido.
 
12 janeiro 2007
Eu.. coração...
Outro dia recebi um flyer e deixei jogado no fundo de uma bolsa. Achei hoje e pareceu perfeito. Não sei de quem é, mas era propaganda de uma peça de teatro...
"Sinto meus pensamentos evaporarem. Como se cada parte do meu corpo estivesse tão quente que impulsionasse todo o meu ser em direção ao céu.
A leveza que expande meu peito e os calafrios que percorrem minha espinha arrepiam cada fio de cabelo que encontram pelo caminho.
Me tiram a razão e colocam o êxtase no seu lugar. Nem sei se ela, a senhora razão, vai me fazer falta agora. Pois o turbilhão de cores, cheiros, sabores que entorpecem meus sentidos são os melhores guias que eu poderia ter nesta louca viagem de emoções.
Cada arrepio vivido, cada suspiro dado são sentidos e saboreados como se fosse o último e o primeiro.
Tempo e espaço não regem mais o meu ser. Não sei o que é real, o que vejo diante de mim ou as lembranças que guardo embaixo da acolhedora escuridão dos meus olhos cerrados. Não quero respostas. Prefiro a inquietude louca e sedutora das perguntas. Que me tiram a passividade e me levam além. Não tem como não pulsar junto com meu coração.
Eu... Coração.
Sou assim... Estou assim.
Enrolado em grossos cobertores vermelhos e quadriculados, recebendo cafuné, tomando chocolate quente e vendo o grande filme da minha vida passar."
 
03 janeiro 2007
Quero que você me dê o que tiver de bom pra dar
Ela estava sentada na areia, ouvia o barulho do mar e olhava o horizonte.
Os pensamentos acelerados (tão conhecidos dela) estavam no ritmo das ondas, indo-e-vindo, incansáveis.
Passou o ano em revista e o misturado de sentimentos a invadiu mais uma vez.
Feliz por todas as conquistas
Insatisfeita com o rumo de algumas coisas
Orgulhosa por ter conhecido novas paisagens
Impotente para fazer com que os outros mudem
Cansada de sonhar e não realizar, de desejar e não poder
A impressão que teve foi que depois de muito tempo, a realidade estampou o que ela não queria ver. E isso não doeu tanto como ela imaginava. Entendeu que o sofrimento todo fez crescer uma capa protetora. Com tristeza, concluiu mais uma vez que suas teorias tortas de supervalorização do amor estavam certas. E isso não a chocou como imaginava. Entendeu que não adianta gastar energia com o que está fora de seu alcance. Entendeu que seus momentos só ainda vão ser companheiros de caminhada por muito tempo. Cansou de se enganar. Redescobriu o desejo pela simplicidade.
Pensou em fazer a tal "listinha de intenções para o ano novo". A mente acelerada pensou mil coisas. Algumas faziam sentido, outras eram baboseiras, nem valia a pena pensar naquilo.
Então, de frente ao mar, com o sol esquentando seu corpo e o céu azul sobre sua cabeça, resolveu fazer um só pedido.
Falou baixinho para o mundo:
- Quero que você me dê o que tiver de bom pra dar!!!