Para você, Bebeta!
Num reino muito, muito perto daqui, existia um povo que vivia de lembranças.
Era um povo que tinha sido muito feliz há alguns anos atrás, durante o reinado de Sua Majestade o Amor. Era uma época de muita felicidade, riso solto, corações acelerados, músicas alegres, dias ensolarados e planos para um futuro eterno. As pessoas viviam despreocupadas, sem medo, acreditando que nada poderia mudar.
Porém, em um feio dia de chuva, as terras foram invadidas pela rainha Tristeza. Ela tomou o reino em um golpe, impondo seu mandato de lágrimas e dor. No início, o povo se rebelou, levantou as armas e foi às ruas brigar pelo direito de ser feliz e pela volta do rei Amor. Mas a tirana Tristeza tinha um exército forte, bem treinado. O povo conseguiu resistir heroicamente por um tempo. Só que a falta de amor os deixava cada vez mais fracos. Até que um dia, a rainha Tristeza subiu sua bandeira no pátio do castelo. O hino nacional mudou, agora todos eram obrigados a cantar e ouvir aquela melodia melancólica e sombria.
O tempo foi passando e a vida continuava. As pessoas levantavam cedo, trabalhavam, comiam, estudavam, voltavam para casa, dormiam. Saiam de férias, viajavam, encontravam-se no bar da moda, batiam papo. Só que algo faltava. Elas haviam perdido o brilho no olhar, o viço na pele, as borboletas no estômago. Era uma agonia viver neste reino depois de ter conhecido o amor.
A tirana Tristeza era casada com o rei Desespero, um homem agoniado, deprimido e pessimista, que espalhava pelo reino todo seu fel. Era um casal estranho. Tinham uma filha, a Saudade, uma criancinha de coração bom, mas muito chata e manhosa. A menininha vivia correndo, gritando e chorando pelo reino, incomodando a todos.
As lembranças eram os melhores momentos deste povo. Logo depois do golpe, todos falavam sobre os bons tempos. Recordar cada detalhe era uma estratégia para trazer um pouco de felicidade aos corações. O tempo foi passando, as pessoas foram acostumando-se com o reinado triste (afinal, acostuma-se a tudo!). Alguns até preferiram assim. Com isso, as lembranças foram perdendo a cor, a forma e até a importância. E assim o povo foi vivendo.
Só que algumas rebeldes insistem em viver relembrando o tempo feliz, desejando-o de volta. Elas inventam formas de manter a felicidade por perto: viagens, tattoos, cantorias, conversas. Elas sentem lá no fundo do coração que o Amor vai voltar, que os momentos alegres vão ter espaço novamente na vida do reino. Elas batalham para que isso aconteça (mesmo se perdendo nas inúmeras tentativas de fazer dar certo). Se apegam na exilada esperança e seguem em frente, torcendo para que o Superolhosverdes e o Homem vai-e-volta apareçam e mudem o final da história.